sábado, 16 de fevereiro de 2013

Tomada de decisão e o poder da intuição

Devemos confiar na intuição na tomada de decisão? Afinal, o que é a intuição?

Na verdade a intuição é um poderoso processo do cérebro, de um sistema inconsciente que fica constantemente monitorando o ambiente e confrontando com os dados que estão armazenados e nos devolvendo respostas, reações ao ambiente. Às vezes confiamos nele e agimos. Às vezes desacreditamos e colocamos o raciocínio para funcionar.

Nem certo nem errado, mas diferente, é a maneira como a intuição lida com um problema decisório ou processa algo que se percebe no ambiente.

Inteligência competitiva tem muito a ver com percepção. E percepção tem a ver com intuição. Porque inteligência competitiva é lidar com o futuro. Interpretar os dados presentes e inferir possibilidades de futuro. E significa lidar com dados esparsos, pouca informação. Tenho um indício de que um concorrente pode estar trabalhando com um novo tipo de componente. Pode ser uma inovação, um produto que está para ser lançado no mercado? A intuição me diz algo. Posso confiar nela e começar a buscar mais informação para verificar minha hipótese.

Mas nem todos os profissionais, executivos, entendem porque levar em conta a intuição. Na verdade significa estar usando um conhecimento tácito, e gerando respostas e percepções que não sabemos conscientemente de onde vem. A intuição é uma caixa preta que gera respostas sem explicar porque.

Temos o que alguns especialistas chamam de Sistema 1 e Sistema 2 de processamento da decisão. Um rápido, o Sistema 1, e um lento, o Sistema 2. O Sistema 1 gera rapidamente resposta a um problema. Sem raciocínio explicitado. Quanto são 2+2 ? A solução já veio na sua cabeça. Sistema 1 trabalhando. Não precisou raciocinar. E quanto é 24*18? Se quiser saber, vai ter que colocar o Sistema 2 em funcionamento, vai ter que fazer a conta. Eventualmente o sistema 1 já calculou, mas não te contou. Quanto dá? Quatrocentos e trinta e dois. Chegou perto?

O Sistema 1 é um poderoso processo que tem padrões armazenados, e no momento em que observamos algo, ele faz analogias, complexas demais para entendermos plenamente, e traz imediatamente, em uma fração de segundos, uma resposta. Enquanto que o sistema 2 leva tempo raciocinando.

A intuição falha, é claro. Mas ela é rápida e poderosa (estou aqui chamando o sistema 1 de intuição. É mais amplo que isso, na verdade. É uma capacidade implícita, subconsciente de raciocínio).

Pago minhas contas entrando com os códigos de barras. Quando vem uma seqüência de zeros, seis, sete, oito, não enxergo direito para contá-los. Tenho que fazer muito esforço. Ou para ler ou para pegar os óculos! Então olho a seqüência e chuto o número de zeros. Invariavelmente acerto. Se vacilar, ficar em dúvida, erro. Não dou tempo à dúvida. É o Sistema 1 funcionando. Se contar zero por zero, estarei usando o Sistema 2. Rigoroso, preciso. Se fizer isso muito tempo, começo a ganhar experiência e passo para o automático. E às vezes falha. Sistema 1 rápido mas impreciso.

Faça a soma, de cada número, somando cada número ao que vem abaixo dele (1000+40 ....+1000...):

1000
40
1000
30
1000
20
1000
10

Se você foi adquirindo esperiência, foi aos poucos entrando no modo automático do sistema 1 que percebeu uma lógica na evolução dos números e chegou ao resultado final 5000. O Sistema 2, de racicínio, deu lugar ao Sistema 1. E errou, pois o resultado final é  4100.

A eficácia da intuição está associada a outros aspectos do funcionamento da mente. Se estamos descansados, de bom humor, leves, tanto a intuição, quanto a criatividade se se expande, sobrepõe ao raciocínio, estamos mais à vontade. Mas se estamos desconfiados, cansados, estressados, somos impulsionados ao sistema 2, a raciocinar mais.

Se 5 máquinas produzem 5 peças em 5 minutos, quanto tempo leva para 100 máquinas produzirem 100 peças? Pense, pense. Se respondeu 100 minutos, errou. Foi seu sistema 1 que respondeu. E o seu sistema 2, preguiço (o de todos são), deixou a tarefa chata para o sistema 1 que agiu no automático, foi induzido ao erro. Mas se você decidiu superar a preguiça e forçou o sistema 2 trabalhar, acabou concluindo que a resposta certa é 5 minutos.

O Sistema 1 é rápido. E o Sistema 2 é lento e exige esforço. Então se pudermos, evitamos usá-lo. O Sistema 1 tem o objetivo de estar constantemente alerta. Se detecta  algo, ou resolve “por impulso” ou alerta o Sistema 2 que passa a tratar conscientemente o problema. Trabalham em dupla.

O sistema 1 é rápido, mas revés da moeda é que o Sistema 1 falha, é fortemente indutível ao erro. Sujeito a viéses cognitivos. Viéses de percepção.  Por exemplo, normalmente um cientista propõe hipóteses e deveria desenvolver sua pesquisa à busca de refutar sua hipótese. Mas freqüentemente faz-se o contrário e buscam-se argumentos para confirmar suas hipóteses. E pesquisas tem demonstrado que temos fortes viéses cognitivos que fazem com que ampliemos os dados que corroboram com nossas hipóteses e somos cegos aos dados que as refutam. É o viés da confirmação. Além deste temos o viés do excesso de otimismo, viés de ancoragem, do status quo, entre muitos outros (ver Baserman, Processo Decisório, Editora Campus).

Por outro lado, as empresas perdem uma enorme quantidade de tempo processando dados, meses às vezes, milhões, para chegar a uma conclusão que era perceptível desde o primeiro instante. Mas não aceitam a percepção.

Não quero dizer que as empresas devam tomar suas decisões baseadas em percepção. Longe disto. O que fazer com o batalhão de dados que são coletados, com as análise profundas que são feitas, se nos guiarmos apenas por percepção? Outro dia um internatuta ficou revoltado com um comentário que pus em meu Blog (http://advisorinteligente.blogspot.com.br/), quando eu afirmei que Data Mining serve para entender o passado e diz pouco sobre o futuro. Que eu não sabia o que estava dizendo, não entendia nada de data mining. Trabalhei décadas com Data Mining, peço desculpas se ofendi alguém. Outro dia troquei emails com meu colega da Stern, New York University, Alex Tuzilin. Grande especialista na área. Há mais de 15 anos discutíamos o poder do Data Mining. E ele comentou, lembrava de nossas discussões,     que estávamos naquela época, anos à frente do nosso tempo. Confesso que senti orgulho ao ler aquilo. E realmente, modéstia à parte escrevia primeira tese na França, na Universidade de Grenoble, de aplicação de técnicas de redes neurais em administração. Hoje a técnica virou carne de vaca. Enfm, não é mérito meu, é que na área acadêmica, anda-se anos à frente da prática, buscando o que tem de novo. Temos que estar à frente de nosso tempo.

E hoje quando falamos que data mining ajuda a entender o passado (e qual o demérito nisso, porque o rapaz ficou tão ofendido?), e que o poder da intuição deve ser compreendido e usado, assusto o leitor. Mas a economia comportamental (Behavioral Economics, para quem quiser procurar pelo Google), tem explorado o comportamento humano na tomada de decisão e buscado entender como funcionam o Sistema 1 e Sistema 2 de processamento. Sistema 1, intuição, subconsciente, rápido, erra sem se dar conta, riquíssimo em conhecimento que aciona em um piscar de olhos (leiam o livro Blink). Sistema 2, a razão, lento, rigoroso, calcula, verifica, consome tempo e energia do cérebro. Os mercados são adeptos do comportamento racional. O investidor é racional, dizem eles. Buscam a eficácia, o caminho de menor esforço. A economia comportamental é vista no mínimo com ceticismo pelos economistas.

Lembro que há muitos anos conheci um especialista em grãos que batia o olho no monte de grãos no armazém e dizia com precisão o volume em sacas contido nele. Sem contar, sem medir. Numa fração de segundos. Sistema 1 funcionando.

Valorizamos a experiência. E o que é a intuição? Intuição apurada? É resultado da experiência. A intuição dos especialistas falha. Falha quando a experiência é contradita por um fato novo. Como diria um provérbio japonês (Shunryu Suzuki), o iniciante tem muitas possibilidades, o especialista apenas algumas.

Diria que um grande desafio para as empresas é como equilibrar intuição com razão para maximizar o resultado do processo decisório. Intuição demais, pode levar a grandes erros. Processos excessivamente racionais, podem levar tanto tempo demais, quanto gastar recursos demais, quanto inibir a criatividade.

Aprendi como meu colega Ben Gilad, que muito se faz com poucos números. A capacidade que temos de gerar bons insights com pouca informação é comprovada nos cursos de análise de inteligência que ele criou na Academy of Competitive Intlligence e que eu reproduzo com meus colegas brasileiros na ADVS Brasil. O exemplo mais impressionante é onde discutimos o futuro de certas empresas, através de estudo de casos e com apenas um parágrafo, 3 linhas de texto, no caso de uma das empresas, os  participantes conseguem inferir a posição dela cinco anos depois, com precisão (Análise Cross Competitor oferecido pela  ADVS Brasil). Neste curso e no de Blind Spots, demonstramos, ou melhor, os alunos descobrem, sua impressionante capacidade de perceber o futuro a partir de pouquíssima informação. Só precisam acreditar em sua percepção. Acreditar no poder de sua intuição e de seu Sistema 1, na sua capacidade de inferir a partir de poucos dados. Usando aparentemente intuição, mas na verdade usando muito mais conhecimento do que se percebe que se tem.


9 comentários:

Maria Alice Fontes disse...

Oi Fernando, parabéns pelo artigo. Muito interessante e importante valorizar a intuição no processo de tomada de decisão nas empresas. No mercado financeiro, quem usa predominantemente o Sistema 1 acaba entrando pelo cano no longo prazo. Mas por outro lado, como psicóloga uso muito da intuição nas minhas avaliações. Ela pode ajudar muito, mas também traz armadilhas. Assim como vc apontou, o equilíbro é mesmo o melhor caminho. Mas como encontrá-lo? Maria Alice Fontes

Blog Fernando de Almeida disse...

Obrigado Lili.

Realmente o pessoal do mercado financeiro tem outra cabeça. Outro debate.

Cynthia disse...

Muito interessante e esclarecedor! Parabéns

Cynthia disse...

Muito interessante e esclarecedor! Parabéns!

Cynthia disse...

Muito interessante e esclarecedor! Parabéns!

Cynthia disse...

Muito interessante e esclarecedor! Parabéns!

Elaine Bloise disse...

Ola Fernando. Nossa que complicado tudo isso!! Aprendi que para se aguçar a intuição deve-se meditar. Há várias técnicas de meditação em que a mente "fica em stand by", nem adormecida, nem ativa num determinado foco. Desta forma, quando se tem um problema para resolver, basta "solicitar" uma solução e praticar a meditação. Tenho praticado bem pouco, mas nunca fiquei sem uma resposta quando usei essa técnica. Acredito que mais que ter "insight", "adivinhando" a solução, a mediação é mais um meio de acesso ao Sistema 1.

Elaine Bloise disse...

Oi Fernando!
Que tal praticar a meditação para acessar "insights" ou "intuição"? Eu pratico pouco mas nunca fiquei sem resposta depois de "encomendar"a solução de um problema antes de praticar a meditação. Talvez essa seja a maneira de chegar ao Sistema 1 inconscientemente.

Blog Fernando de Almeida disse...

Obrigado Cynthia.

Elaine, complicado? A mente prega peças!

Meditação, muito legal fazer. Sugiro você ler o livro o poder do agora.

Fernando