A Shell superou o mercado quando antecipou a ruptura na tendência do preço e oferta de petróleo na década de 70. Ninguém acreditava, ninguém estava preparado. A Shell estava. Ela traçou cenários incluindo aquele onde haveria uma ruptura no preço do petróleo. Passou de patinho feio do setor, em sétima posição a líder. As rupturas acontecem. São imprevisíveis? Ou apenas parecem imprevisíveis?
Os sinais de ruptura muitas vezes existem. E não são fracos. Mas são desprezados. Para não falar de passado, de petróleo, ou de crise do “sub prime de 2008”, uma crise de créditos não honrados, quebra de banco, pois é fácil prever o passado e o que já ocorreu vamos falar de futuro.
Falemos das empresas de automóveis e de toda a indústria e setores correlacionados. E se não houverem mais carros, ou muito poucos no futuro? Bobagem, não? Mas ninguém diz que nunca vai acontecer. Outro dia assisti a um vídeo que mostrava o futuro, onde não havia mais carro, que era coisa do passado. No entanto todo mundo imagina que tudo isso esteja tão longe no futuro, tão incerto. Coisa de filme de ficção científica. Pode ser. Mas os sinais de mudança existem hoje. Trânsito nas grandes cidades, poluição. Sem contar o preço, o custo de manter um carro. As pessoas em cidades como São Paulo não aguentam mais, querem alternativas de transporte urbano. Uns pegam bicicleta, outros vão de ônibus, outros vão a pé. Fala-se de ambiente de sustentabilidade. Então, será que os carros praticamente deixarão de ser usados em 5 anos? Pouco provável. E em 20 anos? Possibilidades remotas de mudança. Mas como sua empresa lida com essas possibilidades “remotas” de mudança? Lida como algo que vai mudando gradualmente, um dia quem sabe e com tempo para se preparar? Mas rupturas não vem aos poucos, vem de repente. Sua empresa está preparada minimamente para as rupturas no ambiente? Leva-as em consideração? Coloca-as em discussão?
As empresas falam de rupturas - quando falam - como algo improvável e continuam seu planejamento, se baseando em tendências para tomar decisões. Vejo as pessoas nas empresas afirmarem que estamos em um ambiente de incertezas e de mudanças. Mas quando vão se planejar, vejo-as tomarem decisão com base em projeções do PIB atual para os próximos 5 anos. Olhar o PIB nos últimos anos, ou até no último ano e projetá-lo. Ou seja, projetar o passado no futuro. O crescimento do PIB está baixo e vai crescer pouco, menos que nos anos anteriores. E vamos acreditar que a tendência se mantém. Nem pensar em rupturas.
Sabemos que estamos em um mundo dinâmico e cheio de incertezas: crise na Europa, tensão na Coreia do Norte, desastres ambientais.
É possível, ou provável se preferir, que daqui a 5 anos o mundo tenha se transformado pouco, com as economias melhorando um pouco, ou piorando um pouco. Mas e se não for o caso? Como sua empresa está preparada? Terá respostas rápidas a mudanças bruscas no cenário onde atua? Quais são essas mudanças possíveis?
Vemos sistematicamente tendências não se comprovarem. Qual era a tendência do PIB a 3 anos atrás? Em 2010 o PIB cresceu 7%. Dois anos depois: Pibinho. Um porcento. Mas por alguma razão, por ser mais fácil ou mais confortável, jogar a possibilidade de mudança em um futuro remoto, as empresas se baseiam nas tendências em relação ao passado para tomar decisão. Não gostamos de pensar em um cenário muito diferente do que estamos vivendo. Então vamos seguindo ignorando a possibilidade de ruptura.
Como fazer então? As rupturas dão sinais. Não ocorrem sem serem anunciadas. Mas vem abruptamente. A casa desaba, mas dá sinais. Vai demorar um pouco mais, um pouco menos para acontecer, mas os sinais de ruptura a antecedem. As pessoas antevêem as rupturas, os carros vão desaparecer um dia, falam sobre a ruptura, mas contam aparentemente com mudanças graduais. Aos pouquinhos, sem impactos rápidos. E um dia não existirão mais carros. Mas aos poucos. Dá tempo para se preparar.
Na área de Engenharia Civil, fala-se de ruptura com e sem aviso. O que os engenheiros fazem?. Existe um processo sistemático de tratamento das rupturas anunciadas. No mundo das economias e dos mercados, se vemos os sinais, é fato que normalmente não podemos evitá-las. Mas podemos nos preparar para elas. No mundo empresarial a atenção aos sinais de ruptura são menores. E as ações preventivas parece que são menores ainda. As empresas jogam a questão para um futuro distante e continuam vivendo as questões do presente. Não se preocupam e não desenham e não analisam cenários de ruptura.
Um exercício de análise de cenários de ruptura ajuda a saber lidar com possibilidades que se ou quando ocorrerem, permitirão ganhar vantagem competititva, ou no mínimo reduzir perdas.
Já pensou em sua empresa? No seu setor? Quais são as rupturas improváveis, ou indicadores de mudança que consegue perceber? Se pegarmos o caso dos automóveis? Existe alguma cidade ou bairro no mundo que está com alguma experiência interessante de não uso de carros? Se der certo em algum lugar do mundo pode ser que se espalhe rapidamente e o que era improvável num momento, se torna realidade.
Faça um exercício na sua empresa, pense nas mudanças improváveis de acontecer. Pense então em seus impactos. E então reflita sobre pensar e se preparar minimamente sobre elas. Se investir um pouco mais que os outros players do mercado. Caso rupturas aconteçam, poderá mudar completamente sua posição no setor. Como fez a Shell no passado.Mas vejo que muitas das empresas com que tenho contato, continuam traçando curvas de tendências e baseados suas decisões e seu futuro em projeções do passado. E o que sua empresa está fazendo a respeito?