Existe uma só maneira de desenvolver processos de IC na empresa? Não. Primeiro em razão da complexidade, ameaças e riscos percebidos do ambiente competitivo. Empresas que vêem o ambiente como mais estável, tendem a ter um comportamento menos intrusivo, menos ativo em sua busca. Outras percebem o ambiente como mais complexo, arriscado e cheio de oportunidades e ameaças. São mais intensas em atividades de IC.
Normalmente as empresas tem atividades de scanning do ambiente, ainda que não deem este nome a elas, pois tem processos informais ou não estruturados, de coleta, análise e uso estratégico de informação do ambiente. Em especial as pequenas e médias empresas (nos EUA mais de 80% das empresas de grande porte tem processos formais de IC). Mas mesmo que se tenham atividades formais e estruturadas, encontram-se diferentes formas de estrutura e organização para IC nas empresas. Em muitos casos a atividade de IC é suportada por uma área funcional do tipo departamento de inteligência competitiva. Sem novidades até aqui. Mas algumas empresas entendem que não necessariamente áreas formais de inteligência competitiva (departamentos ou área de IC) ou processos sistemáticos (coleta estruturada de informações de mercado), são a solução para elas. Isso porque tem diferentes diferentes pressupostos sobre o ambiente competitivo e diferentes características próprias e de seus executivos.
Por exemplo foi constatado que empresas do setor vestuário na Inglaterra, tinham maneiras completamente diferentes de scanear o ambiente, apesar de estarem em um mesmo setor. O que mudava era sua percepção sobre o ambiente competitivo. Algumas entendiam que processos estruturados de coleta de dados, predominantemente quantitativos eram úteis para o planejamento e previsão de suas ações de produção e de vendas. Outras tinham como base a coleta em fontes informais, em lojas, com representantes de vendas, circulando pelo mercado. Não foi identificado se uma maneira ou outra de escanear o ambiente levava a resultados mais favoráveis e decisões mais bem sucedidas. Mas o que se pode observar é que empresas em um mesmo setor podiam ter percepções diferentes do ambiente competitivo que as levava a achar fazer mais sentido escanear o ambiente de maneira mais ou menos estruturada (estudo apresentado por Daft & Weick).
Primeiro ponto: é preciso respeitar as características da empresa e adaptar um modelo mais adequado ao seu perfil organizacional e pessoal. Existem diferentes características que vão impactar a maneira de fazer inteligência competitiva: infra-estrutura formal, envolvimento das pessoas, cultura organizacional, de inteligência, valores pessoais, percepções e experiências anteriores dos gestores.
Segundo ponto: Para Daft & Weick, que pesquisaram sobre a atividade de scanning do ambiente, a maneira mais ou menos estruturada de fazer inteligência competitiva, será função de dois aspectos distintos como consequência do ponto anterior. 1. Os pressupostos da empresa sobre o ambiente competitivo, se o considera ou não estruturável (se é possível ou não identificar uma estrutura acessível a partir da qual se pode coletar dados estruturados, muitas vezes quantitativos). 2. Sua atitude quanto ao grau de intrusão, ou penetração no ambiente competitivo, isto é, o quão intensamente a empresa vai atrás de informação no ambiente competitivo.
A partir destes dois pontos, é possível identificar quatro tipos de comportamento face ao ambiente competitivo que classifico da seguinte maneira: 1. Quando se leva em conta os pressupostos que a empresa tem do ambiente, esta pode ser classificada como perfil tipo Engenheiro ou tipo Arquiteto. 2. Perfil tipo Contemplador ou tipo Investigador, quando se pensa no grau de intrusão da empresa no ambiente competitivo.
Como se pode comparar o tipo Engenheiro com o tipo Arquiteto e o que cada um obtêm do ambiente competitivo? Não vamos explorar o Contemplador versus Investigador. Entendo que qualquer empresa que assumir uma postura contemplativa face ao ambiente e não ativa, de busca de informação está destinada ao fracasso.
A empresa que exerce a atividade segundo o perfil do Engenheiro, assume o ambiente como estruturável, possível de ser compreendido a partir de uma forma estruturada de obtenção de dados. Considera o ambiente de maneira concreta, possui processos com certo grau de rigidez, mensuráveis, com atividades e etapas claramente estabelecidas. Acredita que as informações estão disponíveis e acessíveis no ambiente e que um processo de coleta estruturada, ou a compra de pesquisas irá trazer-lhe o conhecimento necessário a planejar, a agir. Desenvolve coleta de inteligência, análises racionais, monitoramento e mensurações precisos. Se baseia na lógica, sequência linear de procedimentos internos e externos buscando dados e conclusões claros.
Outro perfil de atividade de inteligência, menos comum no mercado, é o que chamo de perfil tipo Arquiteto. O perfil “Arquiteto” que orienta a atividade de inteligência em algumas empresas, considera o ambiente competitivo como pouco estruturável e entende que ferramentas estruturadas de coleta de dados quantititativos não lhe permitem antecipar os movimentos competitivos. Seu esforço se desenvolve a partir da busca de informações predominantemente qualitativas. Penetra no ambiente à busca de perspectivas e de oportunidades de criar a partir do que interpreta. Molda assim o ambiente a partir de suas interpretações. Sua postura está mais próxima da invenção do ambiente do que organização das informações que coleta do ambiente. Criação de sentido, criatividade são melhores analogias. Comparando novamente os dois perfis, o Arquiteto pode ser contrastado ao perfil do Engenheiro. O Arquiteto se aproxima do perfil de um autor que cria, de um inventor. O Engenheiro se aproxima do comportamento de ator, que é um interpretador de uma história já criada.
Para o ator, a história já está escrita no texto desenvolvido pelo autor. Para a área de inteligência de tipo Engenheiro, a história já está inscrita no ambiente. Basta ter os instrumentos adequados de leitura para decodificá-la, basta saber ler. Para a área de inteligência tipo Arquiteto, a história não está escrita. O futuro que se pode antecipar a partir das informações que se obtêm não é absoluto e previsível, não tem resposta evidente e concreta. É fruto da criação não só da empresa, mas dos players que atuam no ambiente. É incerto, é moldado por percepções e perspectivas, não é absolutamente previsível. O ambiente do Arquiteto envolve incerteza, mas envolve a possibilidade de criar e gerar oportunidades. O Arquiteto foge dos pressupostos que reduzem a capacidade de atuação a horizontes limitados. Horizontes que a área de inteligência tipo Engenheiro, considera como já determinados. A área de inteligência tipo Arquiteto, explora novos comportamentos, cria seu próprio ambiente, experimenta, testa, estimula o ambiente. Cria mercados baseados no que pensa poder vender e não esperam a demanda surgir. Uma empresa tipo Apple cria um iPad, cria uma demanda, não espera ela surgir.
A empresa Engenheiro considera o ambiente estruturado e com as respostas já inscritas no ambiente. Usa plataformas estruturadas de coleta: pesquisa de mercado, análise de tendências, previsões na identificação de ameaças e oportunidades. Acompanha as tendências da concorrência, projeta seus movimentos futuros a partir do movimento passado.
Claro que ambos os perfis descritos são perfis ideais, isto é não existe área de inteligência que se enquadra de maneira absoluta em um ou outro perfil. São dois perfis extremos e normalmente vemos as empresas penderem mais para um lado ou para o outro. Penso que uma empresa como a Apple e sua equipe de inteligência, penda mais para o perfil Arquiteto. Mas todas tem um ou outro perfil em maior intensidade. É mais comum ver empresas atualmente, mais próximas do perfil Engenheiro e um número menor de empresas mais próximas do perfil Arquiteto. Menos criativas, mais organizadoras de informação e geradoras de gráficos de tendências a partir dos quais fazem o que chamam de relatórios de análise.
Existe um perfil mais adequado que outro? Entendo que tal como na vida das empresas de construção, um não pode abrir mão do outro. Arquitetos que fogem muito da realidade correm o risco de criar projetos inexecutáveis. Os Engenheiros vem ajudá-los a manter-se mais realistas. E o conjunto produz equilíbrio entre estrutura e criatividade. Tal como deve ser a atividade de inteligência competitiva na empresa. Um equilíbrio entre a estrutura do Engenheiro e a criatividade do Arquiteto. Nem muito para um lado, nem para o outro.
Publicado originalmente no portal Meta Análise em 16 de setembro de 2010 - Inteligência Competitiva: entre o Engenheiro e o Arquiteto http://t.co/V1sh7ik
sábado, 18 de setembro de 2010
segunda-feira, 13 de setembro de 2010
O que é e o que não é inteligência competitiva
As discussões que surgiram sobre inteligência competitiva nos EUA tem origem na área de inteligência militar, tendo alguns conceitos da agência de inteligência americana, a CIA sido adaptados para análise da concorrência, sendo Herring (Academy of CI), precursor da área. Na França, por outro lado, os autores que associam seus trabalhos e pesquisas ligados a inteligência competitiva como LESCA (ADVS), procuram aproximar-se de conceitos mais ligados ao processo de inteligência coletiva.
A literatura sobre IC de uma forma geral relata casos e sugere modelos ainda passíveis de comprovação através de um estudo empírico mais amplo, contando freqüentemente apenas com a opinião do autor a partir de sua experiência profissional. É o que atesta a pesquisa de Saayman et al. (2008) que procura preencher essa lacuna com um estudo quantitativo que busca validar os modelos apontados na literatura como descritivos do processo de CI. Apesar de procurar identificar as particularidades das etapas de 1. planejamento e foco, 2. coleta, 3. Análise, 4. Comunicação, só consegue efetivamente observar três etapas distintas nas empresas, uma vez que as etapas de análise e comunicação se mostram confundidas em uma só etapa. É possível que este resultado se deva ao fato que boa parte da amostra é composta por empresas de pequeno e médio porte e que nestas, análise e comunicação não são etapas claramente distintas, muitas vezes sendo feitas de maneira conjunta pelo corpo diretivo de maneira pouco estruturada.
As discussões sobre IC começam a ser encontradas com mais freqüência na década de 60. Mas há autores que já associam a discussão de CI aos chineses a 5000 atrás pelos chineses (Qingjiu and Prescott, 2000).
Alguns entendem que o processo de inteligência desenvolvido pelas empresas como algo mais amplo e que a forma de se fazer inteligência se relaciona à viabilidade em se analisar o ambiente (Daft e Weik 1984). Ambientes mais complexos são vistos como de difícil compreensão e exigem processos menos sistemáticos de inteligência competitiva.
Alguns pesquisadores e também profissionais de inteligência têm caminhado no sentido de ver a atividade de CI de forma mais abrangente que apenas a análise sistemática de dados de mercado, que é o que Gilad (2008) chama de a escola do Reporters, isto é elaboradores de relatorios.
Para Gilad a riquesa dos processos de inteligência está na capacidade de analisar o ambiente competitivo, gerar perspectivas a partir do que se observa. Defende a escola dos Analysts.
Mas o que é então a inteligência da empresa, inteligência competitiva. É um processo, é dinâmico. Um dado, uma informação em si não é inteligência. Da leitura, análise e interação com a informação é que emerge a inteligência, a perspectiva que busca Gilad. Da mesma forma, um código de software estático não é um sistema de informação. O sistema de informação só se revela na medida em que é processado, só se revela na execução do código. Da mesma forma, a IC não é inteligência se apenas produz relatórios e documentos que organizam os dados e a informação, o produto da inteligência só existe na medida em que existe um processo que mantém a informação viva, que a trata e que gera um produto que é a ação. Bernhardt (1994) diz que a inteligência competitiva é ao mesmo tempo um processo e um produto.
Vista como um processo, a IC produz inteligência quando o produto é a ação decorrente do processo. Uma ação, não apenas um relatório.
Um processo dito de IC deve sensibilizar as pessoas a agirem. O resultado, o produto da inteligência o é somente se significar ação. E para que isto ocorra o processo de inteligência, sua prática deve estar integrada e participativa na discussão do negócio.
Nota-se no entanto, que muitos não incluem a ação em si como parte integrante do processo de IC. É algo posterior ao ciclo de inteligência que se encerra no que se costuma chamar da etapa de disseminação ou comunicação.
Por fim é importante destacar que a atividade de IC transcende uma “área de IC”, pois pode ser desempenhada sem uma função explicita na estrutura organizacional criada especialmente para isto. O exercício de inteligência competitiva é uma atividade de todos em uma empresa e não de uma área da empresa apenas.
(artigo publicado originalmente no portal Meta Análise em 11 de agosto de 2010)
A literatura sobre IC de uma forma geral relata casos e sugere modelos ainda passíveis de comprovação através de um estudo empírico mais amplo, contando freqüentemente apenas com a opinião do autor a partir de sua experiência profissional. É o que atesta a pesquisa de Saayman et al. (2008) que procura preencher essa lacuna com um estudo quantitativo que busca validar os modelos apontados na literatura como descritivos do processo de CI. Apesar de procurar identificar as particularidades das etapas de 1. planejamento e foco, 2. coleta, 3. Análise, 4. Comunicação, só consegue efetivamente observar três etapas distintas nas empresas, uma vez que as etapas de análise e comunicação se mostram confundidas em uma só etapa. É possível que este resultado se deva ao fato que boa parte da amostra é composta por empresas de pequeno e médio porte e que nestas, análise e comunicação não são etapas claramente distintas, muitas vezes sendo feitas de maneira conjunta pelo corpo diretivo de maneira pouco estruturada.
As discussões sobre IC começam a ser encontradas com mais freqüência na década de 60. Mas há autores que já associam a discussão de CI aos chineses a 5000 atrás pelos chineses (Qingjiu and Prescott, 2000).
Alguns entendem que o processo de inteligência desenvolvido pelas empresas como algo mais amplo e que a forma de se fazer inteligência se relaciona à viabilidade em se analisar o ambiente (Daft e Weik 1984). Ambientes mais complexos são vistos como de difícil compreensão e exigem processos menos sistemáticos de inteligência competitiva.
Alguns pesquisadores e também profissionais de inteligência têm caminhado no sentido de ver a atividade de CI de forma mais abrangente que apenas a análise sistemática de dados de mercado, que é o que Gilad (2008) chama de a escola do Reporters, isto é elaboradores de relatorios.
Para Gilad a riquesa dos processos de inteligência está na capacidade de analisar o ambiente competitivo, gerar perspectivas a partir do que se observa. Defende a escola dos Analysts.
Mas o que é então a inteligência da empresa, inteligência competitiva. É um processo, é dinâmico. Um dado, uma informação em si não é inteligência. Da leitura, análise e interação com a informação é que emerge a inteligência, a perspectiva que busca Gilad. Da mesma forma, um código de software estático não é um sistema de informação. O sistema de informação só se revela na medida em que é processado, só se revela na execução do código. Da mesma forma, a IC não é inteligência se apenas produz relatórios e documentos que organizam os dados e a informação, o produto da inteligência só existe na medida em que existe um processo que mantém a informação viva, que a trata e que gera um produto que é a ação. Bernhardt (1994) diz que a inteligência competitiva é ao mesmo tempo um processo e um produto.
Vista como um processo, a IC produz inteligência quando o produto é a ação decorrente do processo. Uma ação, não apenas um relatório.
Um processo dito de IC deve sensibilizar as pessoas a agirem. O resultado, o produto da inteligência o é somente se significar ação. E para que isto ocorra o processo de inteligência, sua prática deve estar integrada e participativa na discussão do negócio.
Nota-se no entanto, que muitos não incluem a ação em si como parte integrante do processo de IC. É algo posterior ao ciclo de inteligência que se encerra no que se costuma chamar da etapa de disseminação ou comunicação.
Por fim é importante destacar que a atividade de IC transcende uma “área de IC”, pois pode ser desempenhada sem uma função explicita na estrutura organizacional criada especialmente para isto. O exercício de inteligência competitiva é uma atividade de todos em uma empresa e não de uma área da empresa apenas.
(artigo publicado originalmente no portal Meta Análise em 11 de agosto de 2010)
quinta-feira, 2 de setembro de 2010
SCIP Brasil 2010 - Estaremos lá
A ADVS Brasil e a ACI - Fuld, Gilad e Herring Academy of Competitive Intelligence, parceira da ADVS no Brasil, estarão no evento da SCIP. O Leonard Fuld da ACI irá fazer um workshop sobre War Game. Eu, Fernando de Almeida falarei sobre modelos e organização para a atividade de Inteligência Competitiva nas empresas. E o Fernando Cortezi da ADVS Brasil irá falar sobre práticas de análise de cenários. O link do evento é: http://www.informagroup.com.br/scip
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